Matriz de Ponta Delgada. Matriz da Horta. Sé Catedral.

         «O Espirito do Senhor está sobre Mim, porque Ele Me ungiu. Enviou-me a anunciar a Boa Nova». Esta expressão com a qual Jesus Cristo reconhece a Sua missão e se cumpria a profecia de Isaías, orienta o sentido da nossa celebração na qual queremos renovar a Graça e o dom que nos foram oferecidos por Jesus Cristo na nossa ordenação sacerdotal e estabelece o sentido da nossa missão no mundo de hoje.

         Fomos ungidos. Já não à maneira do Antigo Testamento mas à maneira de Jesus Cristo. Na sensibilidade da unção exterior reconhecemos o derramar do Dom do Espirito Santo que nos configura a Jesus Cristo para exercermos a missão à maneira do Bom Pastor que dá a vida pelas suas ovelhas.

Daí que a nossa vida sacerdotal exprima, na continua inserção a Cristo, a permanente vida n’Ele. «Tal como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, mas só permanecendo na videira, assim também acontecerá convosco, se não permanecerdes em mim. Eu sou a videira; vós, os ramos. Quem permanece em mim e Eu nele, esse dá muito fruto, pois, sem mim, nada podeis fazer» (Jo.15, 4-5). Este «permanecer» a que Jesus de Nazaré exorta os seus Apóstolos antes da Sua Paixão é algo que deve motivar-nos interiormente de modo que vivamos unidos a Ele que possamos dizer como S. Paulo «o meu viver é Cristo» (Fil. 1, 21).

Caríssimos Sacerdotes, só nesta unção permanente vivida e renovada na escuta da Palavra, na oração, nos sacramentos e na partilha fraterna poderemos edificar uma personalidade apostólica capaz de viver a alegria e a serenidade perante as dificuldades e perplexidades do nosso ministério.

Mas a unção de que somos revestidos e que nos une em presbitério exige que seja vivida em comunhão presbiteral, reconhecendo nos nossos irmãos sacerdotes os seus dons e capacidades e promovendo uma comunidade diocesana que a partir do seu presbitério sente a alegria de ser presença de Jesus Cristo Vivo que veio para servir e não para ser servido e dar a vida pelo resgate de muitos (cfr. Mt. 20, 26-28).

Sim, a comunidade diocesana e com ela o seu presbitério não poderá ter outra aspiração que não seja servir. Servir o outro promovendo as suas qualidades, os seus dons e capacidades; estar ao lado do outro para o ajudar a ultrapassar as suas limitações e os seus temores; partilhar fraternalmente os carismas que são dons de Deus para a edificação de um presbitério alicerçado em Cristo a Pedra angular.

São bem eloquentes e oportunas as palavras de Paulo que dizem: «já não sois estrangeiros nem imigrantes, mas sois concidadãos dos santos e membros da casa de Deus, edificados sobre o alicerce dos Apóstolos e dos Profetas, tendo por pedra angular o próprio Cristo Jesus». E continua realçando que «é n’Ele que toda a construção, bem ajustada, cresce para formar um templo santo, no Senhor». Termina sublinhando que «é n’Ele que também vós sois integrados na construção, para formardes uma habitação de Deus, pelo Espírito» (Ef. 2, 19- 22).

Juntamente e através da Unção, somos participantes do envio que é referido a Jesus Cristo e que Ele nos chama a assumir juntamente com Ele.

O Evangelho ao referir «enviou-Me a anunciar a Boa Nova» determina qual é a missão a desempenhar junto de qualquer situação ou pessoa à qual somos enviados. À imagem de Jesus Cristo, também nós somos testemunhas de uma Boa Noticia e proclamamos com palavras e gestos a Boa Noticia que é Jesus Cristo.

Quando o livro do Apocalipse nos refere que através da Sua Páscoa, Jesus Cristo «fez de nós um Reino de sacerdotes para Deus Seu Pai» está a abrir o nosso horizonte de acção pastoral de modo que a nossa primeira preocupação é promover em cada uma das comunidades cristãs a vivência plena do sacerdócio comum dos fiéis. Como afirma o Concilio «o sacerdócio comum dos fiéis e o sacerdócio ministerial ou hierárquico, embora se diferenciem essencialmente e não apenas em grau, ordenam-se mutuamente um ao outro; pois um e outro participam, a seu modo, do único sacerdócio de Cristo» (LG. 10).

Neste fundamento eclesiológico urge caminhar decididamente na edificação de comunidades visivelmente ministeriais nas quais a Boa Nova seja testemunhada por todos os fiéis e o serviço a prestar à pessoa e à sociedade seja da responsabilidade de todos os cristãos.

O envio que caracteriza o nosso ministério sacerdotal exige a inteira disponibilidade, à maneira de Jesus Cristo que veio não para fazer a Sua vontade mas a vontade do Pai que O enviou (cfr. Jo. 5, 30).

A vida do sacerdote, configurado a Jesus Cristo, e em nome d’Ele enviado, não pode ter outra atitude, outros critérios ou outra audácia que não seja a do Mestre que se despojou totalmente de Si mesmo para uma entrega total na fidelidade ao Pai.

O tempo novo em que vivemos, caracterizado pela ruptura cultural e civilizacional que obriga a recompor o tecido cristão a partir do Evangelho e com ele fermentar a nossa sociedade exige sacerdotes à maneira dos Apóstolos e com as mesmas exigências que Jesus lhes colocou ao determinar a sua missão.

Temos de voltar-nos para o essencial apontado por Jesus Cristo no Seu Evangelho quando diz: «Esta é a vida eterna: que te conheçam a ti, único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem Tu enviaste» (Jo. 17,3); e, ainda, «faz que eles sejam teus inteiramente, por meio da Verdade; a Verdade é a tua palavra. Assim como Tu me enviaste ao mundo, também Eu os enviei ao mundo, e por eles totalmente me entrego, para que também eles fiquem a ser teus inteiramente, por meio da Verdade» (Jo. 17, 17-19).

Fixemos esta oração de Jesus Cristo que dirigiu ao Pai mas tendo-nos a nós na sua intenção e protecção.

Tal como aconteceu com Jesus de Nazaré, no episódio narrado no Evangelho, também as pessoas de hoje têm os seus olhos fixos em nós, não só individualmente, mas enquanto presbitério e enquanto Igreja diocesana. Sob diversas linguagens que importa decifrar estão a questionar-nos sobre a verdade da nossa vocação e missão e sobretudo sobre a concretização da Boa Noticia de que somos portadores.

Que a nossa vida sacerdotal, com todo o nosso entusiasmo e alegria, empenho e fidelidade, possa testemunhar que «hoje cumpriu-se o passo da Escritura que acabais de ouvir».

Imploro de Nossa Senhora, Mãe e Rainha dos Açores, Mãe dos sacerdotes, que nos ajude a viver em profundidade a renovação das nossas promessas sacerdotais e a dar testemunho de alegria no despojamento de nós para a missão que Jesus Cristo nos convoca.

Ámen.

 

+João Lavrador, Bispo de Angra e Ilhas dos Açores

[FAG id=7729]