Capela do Hospital do Divino Espírito Santo. Ponta Delgada | 13 de maio de 2023 [PDF]

“Não vos deixarei órfãos: voltarei para junto de vós”. Que bela promessa a de Jesus. Em momento algum deixará sós os seus amigos. Quanta ternura e cuidado. É como alguém doente saber que tem alguém por perto a quem segurar a mão, com quem falar, rezar, desabafar e até chorar. Quantas vezes ao lado de quem sofre nos basta o silêncio preenchido por um olhar, uma carícia, um sorriso… Diz Maya Angelou, poetisa N. americana: as pessoas esquecem…, mas não o como as fizemos sentir.

 

O amor é já experiência de que o Pai nos acompanha, faz de nós Sua morada com Jesus e o Espírito Santo. Sem o amor, vivemos como órfãos e cegos! A plenitude da luz, da vida e da alegria, da nossa parte, é condicionada pela vontade e pela capacidade de acolhimento. Podemos amar ou não amar, acolher ou não acolher. Deus dá-nos esta liberdade: de acolher ou recusar, de nos abrirmos aos mandamentos de Jesus, ou de nos fecharmos em nós mesmos. Da parte de Deus, podemos estar absolutamente seguros da Sua promessa, o Seu amor nunca diminui, nem desaparece a Sua presença. Da nossa parte é que podem surgir as dúvidas, as incertezas, o cansaço em seguir o Mestre.

 

Todos sabemos o que é a ser doente. Nesses momentos fazemos experiências dolorosas, mas também de confiança em Deus. A doença pode ser oportunidade, se aproveitada, para uma cura espiritual. Lembro-me, depois de uma operação difícil, ter dito: “Deus deu-me uma segunda vida. Devo utilizá-la bem! Na doença, podemos colher a graça de Deus que a acompanha, ajudados pela espiritualidade iluminada na cruz de Cristo. Os irmãos que nos ajudam e animam, sejam os profissionais de saúde, voluntários, familiares, um capelão, etc. são decisivos. Sentir-se acompanhado é já uma graça, ainda mais, quando o Senhor nos prepara para a viagem definitiva até à Sua casa na eternidade, mas, saber acompanhar é uma ciência. Também o nosso testemunho de fé pode ajudar quem está doente. Lembro-me que muitas vezes, quando tinha uma situação difícil, passava a confiá-la a doentes… Dava sempre resultado. A sua oração e sacrifício oferecidos traziam autênticos milagres… Mas, muitas vezes, perante um doente, pouco mais sei dizer do que contar como eu próprio vivi as minhas situações de doença…

 

Hoje, temos na mente a imagem do SSCM. Ele sabe bem o que são as provações humanas e dá o exemplo de como nos podemos abandonar na vontade de Deus sempre que os sofrimentos físicos, espirituais ou mentais nos vêm. Não vos deixarei sós! Estamos, aqui, um bom grupo de sacerdotes como prova disso. Em nome de Cristo, vamos celebrar convosco, para além da Eucaristia, o sacramento da cura. Seremos instrumentos dum amor visível e cuidado amoroso de Deus, através da Unção dos doentes. Oxalá este momento seja de verdadeira festa.

 

O Evangelho fala-nos de amar e ser amado e fala-nos do espírito Santo dado a quem amar como Jesus.  Amar é saber olhar como Cristo nos olha, querer o melhor do outro, como quem o quer curar definitivamente. Quem nunca fixou o olhar no rosto do senhor Santo Cristo? Ao olhar a imagem, os nossos olhos cruzam-se instintivamente com os dele e descobrem um olhar doído num rosto torturado pelos espinhos, desfigurado pelas próprias gotas de sangue derramadas por nós, e pelos nossos pecados! Simone Weil dizia: “é o olhar que nos salva”.

 

Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos amigos. Prestar serviços com amor é dar a vida pelo irmão, dar-lhe ânimo e coragem.  Quando servimos alguém, por amor, estamos apenas a fazer o que gostaríamos que nos fizessem. E, quando chegar a nossa hora, se precisarmos da caridade do nosso irmão, não nos sintamos humilhados. No juízo final, ouviremos Jesus repetir: «Eu era… doente… e tu me visitaste» (Mt 25, 36), eu estava preso, estava nu, tinha fome…, onde Jesus se esconde é precisamente nos que sofrem e são necessitados.  Por isso, mesmo assim, agradeçamos a nossa dignidade respeitada, mas agradeçamos com grande coração àqueles que nos ajudam, reservemos o mais profundo agradecimento a Deus que criou o coração humano bom e caritativo, para Cristo que, pintando a Boa Nova com o «seu» mandamento, levou um número infinito de corações a distinguirem-se pala ajuda ao próximo.

 

 

+ Armando, Bispo de Angra