Sé Catedral.

Ressoam nesta noite as mesmas palavras que o Anjo dirigiu às mulheres que procuravam a Jesus de Nazaré no sepulcro: «sei que procurais a Jesus, o Crucificado. Não está aqui: ressuscitou como tinha dito».

Estas palavras provocam admiração, assombro, espanto, alegria e entusiasmo. Este percurso que necessita de ser iluminado pela acção do Espirito Santo convoca-nos para a experiência mais inaudita, notável e maravilhosa de toda a história.

Este Jesus de Nazaré que segundo os relatos da história foi condenado, homem bom, mas indesejado, afinal é testemunhado vivo. Por isso, a nossa esperança num mundo novo, na nova criação, numa humanidade nova, criaturas novas, torna-se agora possível.

Este percurso não se limita apenas ao trajecto do vai e vem daquelas mulheres. Ele é sinal do grande percurso da história da humanidade que desde os inícios da criação caminha no meio de dores, sofrimentos, alienada pelo pecado, vitima da escravidão e mergulhada nas trevas da ignorância, agora,  iluminada e fecundada pela luz pascal do Ressuscitado, atinge o seu auge e o seu cume, a sua realização e o seu ápice, porque da Ressurreição de Jesus Cristo todos somos chamados a viver.

Como o tempo que vivemos de sofrimento, de perplexidade e de solidão, requer a luz nova do Ressuscitado para nos abrir a mente e o coração como luz sobre a realidade do que somos e do chamamento à dignidade que Deus nos quer oferecer.

A liturgia desta noite realça o sinal da luz e a proclamação da Ressurreição de Jesus Cristo que, destruindo as trevas do pecado, da ignorância e da morte, oferece a Sua luz a todos os homens em qualquer condição de raça, cor, religião ou cultura e prolonga-se pela longa narração da história da Salvação que partindo da Criação sublinha os grandes momentos da intervenção de Deus na história do Seu Povo.

O centro de toda a história está na Ressurreição de Jesus Cristo. Para ela se encaminha toda a humanidade de forma consciente ou inconsciente. Por isso, é fundamental que aceitemos o convite a percorrer o caminho que leva ao encontro de Jesus de Nazaré.

Porque se na verdade, num primeiro momento, talvez ainda não iluminados pela acção do Espirito Santo e sem uma verdadeira consciência da nossa participação na Sua ressurreição, após o anuncio e a descoberta de que Aquele que estava morto já não está aí, mas que ressuscitou, oferece-nos um novo caminho que nos leva ao encontro dos irmãos para com eles partilhar desta novidade que gera comunidade, comunhão, e nos impulsiona para a missão de anunciar a Boa Noticia que é Jesus Cristo Ressuscitado.

Momento particularmente significativo é o convite que nos é dirigido a vivermos a experiência da Ressurreição na nossa condição de baptizados. Por isso, somos interpelados pelas palavras que S. Paulo dirige à comunidade cristã de Roma e nos propõe a nós hoje afirmando que «todos nós que fomos baptizados em Jesus Cristo, fomos baptizados na Sua morte. Sepultámo-nos com Ele, pelo baptismo, na morte, e assim como Cristo ressuscitou dos mortos, por meio da glória do Pai, também nós caminhamos numa vida nova».

Celebramos a Páscoa da Ressurreição na nossa condição de Baptizados mas a necessitar de aprofundar em nós a experiência de vida cristã. Vida nova em Cristo, partilhada em comunidade cristã, testemunhada perante o mundo que necessita de se abrir à luz do Ressuscitado para que o homem se encontre com Aquele que responde às suas perguntas existenciais e lhe devolve o sentido para a sua vida.

É paradoxal para nós, nas condições sociais de pandemia que nos impedem de estarmos presencialmente em comunidade. Poré, esta situação deve despertar-nos para um desejo maior de encontro e participação comunitária.

Pela Ressurreição de Jesus Cristo é toda a criação que é renovada. Ele é a primícia de uma nova criação.

Como refere o Papa Francisco, «o Novo Testamento não nos fala só de Jesus terreno e da sua relação tão concreta e amorosa com o mundo; mostra-no-Lo também como ressuscitado e glorioso, presente em toda a criação com o seu domínio universal» (LS.,100).

De facto, «foi n’Ele que aprouve a Deus fazer habitar toda a plenitude e, por Ele e para Ele, reconciliar todas as coisas (…), tanto as que estão na terra como as que estão no céu» (Cl 1, 19-20). Aliás, «isto lança-nos para o fim dos tempos, quando o Filho entregar ao Pai todas as coisas “a fim de que Deus seja tudo em todos” (1 Cor 15, 28)» (LS., 100).

Reconhecemos, deste modo, que «as criaturas deste mundo já não nos aparecem como uma realidade meramente natural, porque o Ressuscitado as envolve misteriosamente e guia para um destino de plenitude» (LS., 100). A partir desta maravilha. «as próprias flores do campo e as aves que Ele, admirado, contemplou com os seus olhos humanos, agora estão cheias da sua presença luminosa» (LS., 100).

É verdadeiramente na edificação desta criação renovada que os cristãos e as comunidades cristãs, uma vez em comunhão com Jesus Cristo Vivo, se devem empenhar.

É esta páscoa semanal vivida na Eucaristia e valorizando o domingo que como baptizados somos chamados a enaltecer. Na verdade «o domingo é o dia  da Ressurreição, o “primeiro dia” da nova criação, que tem as suas primícias na humanidade ressuscitada do Senhor, garantia da transfiguração final de toda a realidade criada» (LS., 237).

Mas é também à luz da Ressurreição que nos envolve na tarefa da edificação de uma nova criação, livre, partilhada, fraterna e solidária que devemos optar por um estilo de vida sóbrio e humilde, capaz de partilhar com os mais excluídos para, através de gestos concretos, oferecer a esperança a todos os que não vivem em pleno a sua dignidade humana.

Celebramos a Ressurreição de Jesus Cristo envolvidos na caminhada sinodal. Esta é verdadeiramente o noite santissima que nos oferece os fundamentos para uma autêntica caminhada cristã em conjunto, promovendo a comunhão com o Ressuscitado, na edificação de comunidades cristãs conscientes da sua fé, em partilha de dons e carismas entre os seus membros, numa participação activa entre todos os baptizados que integram a comunidade e com o ímpeto missionário de oferecer ao mundo de hoje a luz nova que vem do Ressuscitado.

Há no Evangelho de hoje dois apelos que são muito actuais: um refere «não tenhais medo»; o outro incentiva a ir ao encontro dos outros discípulos.

Na verdade, nos grandes  momentos de revelação, aparece sempre o apelo a não ter medo. Também hoje, perante uma cultura do medo e que provoca o receio, senão mesmo o pânico, que paralisa, somos desafiados a fazer a experiência do Ressuscitado sem temor. Do mesmo modo, sempre que Deus se revela provoca o dinamismo do envio. Ninguém poderá calar para si o que viu e ouviu. Forçosamente terá de O anunciar e testemunhar.

É nestes sentimentos e no contexto da pandemia e sofrendo com ela que formulo votos de Santa e Feliz Páscoa para todos os diocesanos, os que estão no território da Região Autónoma mas também dos que estão na diáspora, para os idosos, os doentes, os presos e os que sofrem de exclusão. Para todos uma santa e feliz Páscoa.

Imploro de Nossa Senhora, Mãe e Rainha dos Açores, que se alegrou com a Ressurreição do Seu Filho e que O torna presente na Sua Igreja que nos abençoe e nos encaminhe pelas sendas da evangelização do mundo de hoje.

 

Amen.

+João Lavrador, Bispo de Angra e Ilhas dos Açores