Matriz. Ponta Delgada.

Neste domingo, dia mundial das missões, nesta celebração em que a Igreja Diocesana sente-se agradecida pelo serviço dos novos Ouvidores e de novos responsáveis pelos serviços diocesanos que hoje iniciam as suas funções, a Palavra de Deus convida-nos em primeiro lugar a reconhecermos a nossa vocação que brota da iniciativa amorosa de Deus; segue-se a exortação à proclamação e testemunho da Boa Nova contemplando as palavras elogiosas que Paulo dedica á comunidade cristã de Tessalónica; e por último, deparamo-nos com as armadilhas que confrontam a missão e que estão personificadas pelos discípulos dos fariseus e pelos herodianos.

Numa palavra estamos perante a missão fundamental da Igreja de Evangelizar e os confrontos com que se depara num mundo que através dos poderes instalados sentem-se ameaçados pela presença pública da fé cristã que obrigatoriamente terá de ser testemunhada no meio da sociedade e no seio da cultura.

Na verdade, por mandato divino, a Igreja tem por missão evangelizar. Isto é, em todas as suas acções tem como único objectivo anunciar e testemunhar a Boa Noticia da Salvação ao mundo.

Esta exigência está bem presente na Exortação Apostólica de Paulo VI «Evangelii Nuntiandi», quando afirma que «evangelizar constitui, de facto, a graça e a vocação própria da Igreja, a sua mais profunda identidade». Deste modo, «ela existe para evangelizar, ou seja, para pregar e ensinar, ser o canal do dom da graça, reconciliar os pecadores com Deus e perpetuar o sacrifício de Cristo na santa missa, que é o memorial da sua morte e gloriosa ressurreição» nº 14).

Mas para ser evangelizadora a Igreja tem necessidade de escutar permanentemente o Evangelho. Realmente, «evangelizadora como é, a Igreja começa por se evangelizar a si mesma». Configurando-se «como comunidade de crentes, comunidade de esperança vivida e comunicada, comunidade de amor fraterno, ela tem necessidade de ouvir sem cessar aquilo que ela deve acreditar, as razões da sua esperança e o mandamento novo do amor». Mais ainda, «Povo de Deus imerso no mundo, e não raro tentado pelos ídolos, ela precisa de ouvir, incessantemente, proclamar as grandes obras de Deus, que a converteram para o Senhor; precisa sempre ser convocada e reunida de novo por ele». Assim, «numa palavra, é o mesmo que dizer que ela tem sempre necessidade de ser evangelizada, se quiser conservar frescor, alento e força para anunciar o Evangelho» (EN, 15).

É muito eloquente a palavra de S. Paulo com a qual saúda, elogia e fortalece a fé da comunidade de Tessalónica. Na verdade o agente da evangelização é a Igreja. Pertence-lhe a ela, por vontade divina, de chamar, formar e enviar os evangelizadores. Deste modo, verificamos que a acção evangelizadora não é depende do gosto ou da iniciativa individual, mas exige uma intima comunhão com Jesus Cristo, com a Igreja e profunda fidelidade ao Evangelho e á proposta da Igreja que oferece os modelos evangelizadores para cada tempo histórico.

Paulo VI acautela esta exigência evangelizadora quando sublinha que «enviada e evangelizadora, a Igreja envia também ela própria evangelizadores». Realmente, «é ela que coloca em seus lábios a Palavra que salva, que lhes explica a mensagem de que ela mesma é depositária, que lhes confere o mandato que ela própria recebeu e que, enfim, os envia a pregar». E acrescenta que «a pregar, não as suas próprias pessoas ou as suas ideias pessoais,  mas sim um Evangelho do qual nem eles nem ela são senhores e proprietários absolutos, para dele disporem a seu bel-prazer, mas de que são os ministros para o transmitir com a máxima fidelidade» (EN, 15).

A evangelização deve nortear-se pela fidelidade ao Evangelho, convida à conversão e não temerá o confronto com os poderes do mundo. Deste modo, o autêntico evangelizador formado na escola de Jesus Cristo, aprende d’Ele a não se deixar dominar pelo mundo mas a vencê-lo pela misericórdia pela ternura e pelo amor. Homem livre que liberta, assim deve ser quem se dispõe a seguir a Jesus Cristo na missão evangelizadora. Por isso, «a Igreja evangeliza quando, unicamente firmada na potência divina da mensagem que proclama, ela procura converter ao mesmo tempo a consciência pessoal e coletiva dos homens, a atividade em que eles se aplicam, e a vida e o meio concreto que lhes são próprios» (EN, 18).

Para o Papa Francisco «a alegria do Evangelho, que enche a vida da comunidade dos discípulos, é uma alegria missionária» (EG, 21). E, por isso, é vivida por todo o Povo de Deus o qual é chamado em todos os seus membros a ser evangelizador.

Eis o maior de todos os desafios. Viver o Evangelho com alegria e deixar que esta se torne expansiva para a outros contagiar. Mais ainda, esta alegria que brota do encontro com Jesus Cristo é vivida por todos os baptizados e faz deles participantes da missão da Igreja. Na verdade «o Evangelho fala da semente que, uma vez lançada à terra, cresce por si mesma, inclusive quando o agricultor dorme (cf. Mc 4, 26-29)» (EG, 22). Deste modo, «a Igreja deve aceitar esta liberdade incontrolável da Palavra, que é eficaz a seu modo e sob formas tão variadas que muitas vezes nos escapam, superando as nossas previsões e quebrando os nossos esquemas» (EG, 22).

Nas sendas do Concilio Vaticano II, a evangelização exige uma permanente atenção e discernimento dos Sinais dos Tempos e uma renovação constante. Disso nos dá conta o Papa Francisco quando nos adverte dizendo que sonha com «uma opção missionária capaz de transformar tudo, para que os costumes, os estilos, os horários, a linguagem e toda a estrutura eclesial se tornem um canal proporcionado mais à evangelização do mundo actual que à auto-preservação» (EG, 27).

Realmente, «a reforma das estruturas, que a conversão pastoral exige, só se pode entender neste sentido: fazer com que todas elas se tornem mais missionárias, que a pastoral ordinária em todas as suas instâncias seja mais comunicativa e aberta, que coloque os agentes pastorais em atitude constante de “saída” e, assim, favoreça a resposta positiva de todos aqueles a quem Jesus oferece a sua amizade» (EG, 27).

Caros Ouvidores que hoje assumis a vossa tarefa tão importante na vida da Igreja diocesana, pedia-vos que coloqueis todo o vosso esforço em formar um presbitério em comunhão com Jesus Cristo entre todos os seus membros, que edifiqueis comunidades verdadeiramente evangelizadoras, a viverem a alegria do Evangelho e a testemunhá-lo junto dos irmãos, que cuideis da renovação conciliar de modo que sejamos uma Igreja a discernir os Sinais dos Tempos para melhor responder à missão que nos é confiada, que não tenhamos medo de viver a liberdade de quem se encontra com Jesus Cristo no meio dos confrontos do mundo, que cuidemos de promover comunidades inteiramente ministeriais.

Imploro de Nossa Senhora Mãe e Rainha dos Açores que abençoe o vosso trabalho pastoral e que lance o seu olhar materno sobre todos os que convosco irão trabalhar pastoralmente.

 

+João Lavrador, Bispo de Angra e Ilhas dos Açores

 

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