Santuário Nossa Senhora da Conceição. Angra do Heroísmo | 30 de abril de 2023 [PDF]

Hoje é dia do Bom Pastor e Dia Mundial das vocações.

Temos um Pastor Bom que tem voz e se faz ouvir e reconhecer porque conhece o seu rebanho, cada um pelo nome, de todos cuida e conduz a belas pastagens da salvação. Conduziu-nos hoje à Eucaristia, onde nos alimentará da Sua Palavra reconfortante e do Seu Corpo “para a vida do mundo” e não apenas para a santidade pessoal. Sou hoje agradecido a Deus pela vocação que me deu chamando-me a ser ministro ordenado e dou graças a Deus por todos quantos de entre vós vivem em atitude de serviço a vocação a que fostes chamados: seja ela de consagração religiosa ou laical, na família ou Institutos Seculares, como presbíteros ou diáconos, na Igreja local ou abertos ao mundo, em missão. Quero lembrar todos os aqui nascidos e que partiram para missão para outras dioceses.

De uma maneira especial saúdo os que ainda buscam a sua própria vocação, os jovens e todos os que já estão num caminho de discernimento como os nossos seminaristas. Cada vida é uma história de amor de Deus connosco. Ele tem para todos um desígnio de amor, chamando a uma determinada condição de vida, para que seja, Nele e com Ele, uma forma de dar a vida em serviço aos irmãos. Saúdo todos os jovens para que encontrem na Igreja espaços apropriados para uma caminhada vocacional, seja ao Matrimónio seja a uma vocação de consagração. Lembra o Papa na sua mensagem para hoje: “Deus “concebe-nos” à sua imagem e semelhança e quer-nos seus filhos: fomos criados pelo Amor, por amor e com amor, somos feitos para amar.

No decurso da nossa vida, este chamamento, inscrito nas fibras do nosso ser e portador do segredo da felicidade, alcança-nos, pela ação do Espírito Santo, de maneira sempre nova, ilumina a nossa inteligência, infunde vigor na vontade, enche-nos de admiração e faz arder o nosso coração. Às vezes irrompe até de forma inesperada em momentos que mudam a vida, dando-lhe uma fisionomia que dura para sempre porque faz trocar o instante pelo eterno.

Continua o Papa: “Mas a chamada divina ao dom de nós mesmos abre estrada gradualmente, através dum caminho: em contacto com uma situação de pobreza, num momento de oração, graças a um claro testemunho do Evangelho, a uma leitura que nos abre a mente, quando ouvimos uma Palavra de Deus e a sentimos dirigida precisamente a nós, no conselho de um irmão ou de uma irmã que nos acompanha, num período de doença ou de luto… A fantasia de Deus que nos chama é infinita”.

É assim, também para vós, caros Leonel, Rui e André. Será um passo na vossa caminhada como cristãos, quem sabe a caminho do Ministério Ordenado, mas recebeis hoje um ministério laical e que pode ser recebido por qualquer leigo preparado. ” Na linguagem do Novo Testamento, “ministro” é sinônimo de “servo”; se não, mesmo, de “escravo”. Receber, portanto, oficialmente, um ministério na Igreja e da Igreja significa ter a oportunidade de viver o convite evangélico: «Tornar-se grande tornando-se servos». Lembro as palavras de Jesus: «O maior entre vós será vosso servo”.

De que grandeza fala Jesus? Aquele que aceita o chamamento para se tornar ministro entre os seus irmãos e irmãs escolheu não mais ser senhor de sua própria vida, mas ser servo, entregando-se a um só Senhor – o Senhor Jesus Cristo – e dedicando tempo, capacidade e energia para realizar sua vontade.

Daqui a pouco, a homilia ritual que a Igreja nos propõe dirá com simplicidade e clareza o que vos espera e que estais preparados para viver: «Queridos filhos, participareis de modo especial no ministério da Igreja, que tem o cume e a fonte da sua vida na Eucaristia, através da qual ela se edifica e cresce como Povo de Deus. É-vos confiada a tarefa de ajudar os presbíteros e diáconos no desempenho das suas funções e, como ministros extraordinários, podereis distribuir a Eucaristia a todos os fiéis, mesmo aos doentes».

Mesmo aos doentes: é isto que gostaria de sublinhar acima de tudo. O vosso serviço ao altar – não o esqueçam! – é um serviço que se realiza no momento culminante da vida da Igreja, a Santa Missa, mas este cume é como o cimo de uma montanha: há toda a montanha abaixo do cume, e distribuir, como ajuda ao sacerdote, a quem em primeiro lugar pertence, a comunhão aos fiéis que estão na igreja, pressupõe o serviço prestado aos que não podem ir à igreja, sobretudo idosos, doentes. Aproveitai este ministério para desenvolver o vosso amor e cuidado pelos mais frágeis como uma etapa do vosso discernimento. Não deixeis de visitar estas pessoas, de lhes levar o conforto da visita, da oração feita com eles e de lhes levar o Santíssimo Sacramento. Não se esqueçam que o cume é o cume, mas os picos apoiam-se no resto da montanha… Para ajudar os sacerdotes, o vosso serviço aos idosos e aos doentes nas suas casas torna presente o amor materno da Igreja e conforta a solidão e a dor. O vosso serviço continuará no diaconato, mas não esperem até então para o exercitar: realizai-o com cuidado, conscientes de que é um grande ato de caridade!

Simbolicamente, um de vós irá hoje ajudar a preparar o altar e outro irá distribuir a Sagrada Comunhão. Sempre que seja necessário e não haja Ministros da Comunhão, esta é uma das vossas tarefas. Vivemos tempos de forte virtualização da vida. Oxalá este ministério não seja algo de virtual ou visto como mero degrau para algo que considerais maior, o ser padre. Servir é o Grande Ministério. Mostrai-o!

Sois instituídos num tempo em que na Igreja universal já estão oficialmente reconhecidos 3 ministérios de leigos: Leitor, Acólito e Catequista. Que o vosso seja também estímulo para que muitos batizados queiram aprofundar os seus conhecimentos e, por amor aos irmãos e às comunidades que servem, possam rapidamente vir a ser instituídos. Estes ministérios não nascem do Ministério Ordenado, mas do batismo, onde o Espírito Santo é dado a todos para a santificação do mundo, mas também para o serviço na comunidade sempre que necessário. Quem dera que, dentro de pouco tempo, estivéssemos aqui a instituir novos ministros leigos, sobretudo para a coordenação de Leitores, Acólitos e catequistas.

Os ministros ordenados, enquanto tais, representam Cristo-Cabeça, não o Cristo-todo. Por isso não esgotam nem absorvem toda a rica ministerialidade com que se tece e embeleza o corpo de Cristo, para o bom desempenho do mandato missionário recebido do seu Mestre e Senhor, na força do Espírito Santo. Os diferentes ministérios, ofícios e funções na Igreja, quer derivem do sacramento da Ordem, quer derivem dos Sacramentos do Batismo e da Confirmação e ainda do Matrimónio, não estão entre si numa relação de superioridade ou inferioridade, mas sim de complementaridade na diversidade, e no serviço e acolhimento recíprocos.

Lembro a grande “viragem” teológica que representou a decisão conciliar, expressa na Constituição Dogmática sobre a Igreja Lumen gentium, de fazer preceder o capítulo dedicado à Hierarquia de um capítulo novo sobre o Povo de Deus. Porque aquilo que é comum a todos os cristãos precede todas e quaisquer distinções entre eles e, por conseguinte, precede o necessário, mas posterior discurso sobre a essencial estrutura hierárquica da Igreja. O Batismo é o sacramento da igualdade radical entre todos os cristãos.

Mas diz o documento da CEP sobre os ministérios: “chegou a hora de dar mais um passo e transpor a reforma pastoral dos ministérios laicais dos documentos oficiais da Igreja para a vida das nossas Igrejas locais. «Oferecer aos leigos de ambos os sexos a possibilidade de aceder aos ministérios [instituídos], em virtude da sua participação no sacerdócio batismal, incrementará o reconhecimento, inclusive mediante um ato litúrgico (instituição), do contributo precioso que, desde há tempo, muitíssimos leigos, incluindo mulheres, oferecem à vida e à missão da Igreja». Não nos bastam ministérios para a edificação interior da Igreja, são precisos ministérios para a sua missão no mundo em ordem a permear de espírito evangélico as realidades do mundo e da nossa sociedade.

O Papa Francisco confiou às Conferências Episcopais a responsabilidade de «estabelecer critérios adequados para o discernimento e a preparação dos candidatos e das candidatas aos ministérios do Leitorado e do Acolitado – e de Catequista –, ou de outros ministérios que considerem instituir, segundo o que já foi disposto no Motu Proprio Ministeria quaedam, com a prévia aprovação da Santa Sé e de acordo com as necessidades da evangelização no seu território».

Quando ainda pároco, refletimos que, na Assembleia litúrgica, na Missa, ninguém deveria desempenhar mais que um serviço ou ministério: um membro do grupo coral não deveria ser leitor pois já tem participa no ministério do canto, um acólito não deve fazer o peditório, etc. Alguém muito escandalizado e santo clama: “mas, então agora já não sei ler”? A Assembleia litúrgica é modelo de sinodalidade, onde cada um é importante e não é pelo acumular de tarefas que alguém vale mais. Mais importante que fazer bem é ajudar duas pessoas a fazê-lo igualmente. Por isso precisamos de quem vivendo a palavra e sendo leitor, assuma o ministério de ensinar a ler, meditar e proclamar a Palavra de Deus, também na liturgia; de quem ame e se alimente da oração e sirva ao altar, mas ensine outros a fazer o mesmo, dê catequese e vá envolvendo mais novos para se enamorarem do Evangelho e o partilhem com outros, mais novos ou mais velhos.

Lanço o desafio a todos os Pastores para que, com os seus Conselhos Pastorais estudem o documento sobre os Ministérios há pouco saído e vejam como fazer aparecer nas Assembleias litúrgicas a beleza de uma Igreja ministerial, nascida do carisma batismal do Povo de Deus.

Nesta bela igreja, resplandece diante de nós, a Virgem Mãe que participou como ninguém no Mistério de Cristo. A Ela, ao seu Imaculado Coração, vos confiamos e nos consagramos! Louvado seja Jesus Cristo!

 

 

+ Armando, Bispo de Angra